O encerramento da Usina Santa Elisa em Sertãozinho provoca efeitos profundos na economia local, emprego, agricultura e sociedade, exigindo estratégias para recuperação e diversificação.
Contexto histórico da Usina Santa Elisa em Sertãozinho
A Usina Santa Elisa, situada em Sertãozinho (SP), representa um marco na trajetória do setor sucroenergético brasileiro. Fundada em 1936 pela família Biagi, a usina foi protagonista no desenvolvimento da indústria sucroalcooleira nacional, permanecendo sob administração familiar por três gerações até ser adquirida pela Louis Dreyfus Company em 2009 e, posteriormente, incorporada à Raízen em 2021. Ao longo de quase nove décadas, a Santa Elisa consolidou-se como símbolo da pujança da cana-de-açúcar no interior paulista, alcançando em 1998 o posto de maior unidade de moagem do mundo, com mais de 7 milhões de toneladas processadas naquela safra.
A planta industrial detinha capacidade para moer cerca de 6,1 milhões de toneladas de cana-de-açúcar e administrava aproximadamente 36,4 mil hectares de lavoura na safra 2024/25. Sua influência econômica e social para Sertãozinho era notável, impulsionando o progresso do município e reforçando sua posição como polo tradicional de tecnologia e produção canavieira.
O anúncio do fechamento da Santa Elisa, realizado em julho de 2025 pela Raízen, inseriu-se em um cenário de reestruturação empresarial motivado por desafios financeiros significativos. Com uma dívida líquida estimada em R$ 34 bilhões ao término da safra 2024/25, a companhia optou por uma estratégia de "reciclagem de portfólio", buscando maior eficiência agroindustrial ao desativar unidades consideradas pouco rentáveis.
Impactos econômicos do fechamento da usina
O encerramento das operações da Usina Santa Elisa desencadeou um impacto econômico imediato e expressivo sobre Sertãozinho e municípios vizinhos. Aproximadamente 1.200 trabalhadores foram dispensados diretamente, sendo 234 residentes locais, conforme dados oficiais da prefeitura. O sindicato estima que até 2 mil empregos tenham sido atingidos quando considerados colaboradores das cidades do entorno que dependiam direta ou indiretamente da usina.
Além das demissões diretas, toda a cadeia produtiva regional sofreu abalo relevante. Fornecedores, prestadores de serviços e empresas de manutenção ligados à operação da Santa Elisa viram negócios fragilizados ou interrompidos. O Centro Nacional das Indústrias do Setor Sucroenergético e Biocombustíveis (Ceise BR) alertou para o risco de comprometimento da sustentabilidade industrial local, colocando em xeque a vitalidade do polo sucroenergético de Sertãozinho e da região metropolitana de Ribeirão Preto.
Como parte do processo de ajuste financeiro, a Raízen negociou até 3,6 milhões de toneladas de cana-de-açúcar — englobando produção própria e contratos com fornecedores — por cerca de R$ 1,045 bilhão. A matéria-prima será redirecionada para outras usinas parceiras na região, como São Martinho, Balbo, Bazan, Toniello e Usina da Pedra. Essa redistribuição tende a mitigar parcialmente o impacto na produção agrícola regional; contudo, não soluciona o problema da desocupação da planta industrial e seus efeitos econômicos imediatos.
Repercussões sociais para trabalhadores e comunidade
A suspensão das atividades na Santa Elisa provocou repercussões sociais profundas sobre os trabalhadores e o tecido social sertanezino. Muitos funcionários foram surpreendidos pelo anúncio, resultando em clima generalizado de apreensão e incerteza. O presidente do sindicato local classificou a decisão como uma "tragédia sem explicação" e um trauma coletivo para a cidade, destacando a busca por um pacote de benefícios capaz de suavizar as consequências para os demitidos.
A administração municipal tem atuado para minimizar os impactos sociais. Entre as ações emergenciais está a realização de mutirões de emprego organizados pelo Posto de Atendimento ao Trabalhador (PAT), em parceria com o SENAI, empresas privadas e entidades representativas, visando à rápida recolocação dos trabalhadores no mercado. Além disso, há iniciativas voltadas à requalificação profissional e ao suporte social às famílias afetadas.
Os efeitos se estendem também a fornecedores e prestadores de serviços locais que, diante da interrupção dos contratos com a usina, enfrentam desafios para manter suas atividades. Essa situação amplia o alcance do impacto social além dos funcionários diretos, alcançando a economia informal e comprometendo a qualidade de vida na comunidade.
Efeitos na agricultura e produção de cana-de-açúcar
A paralisação da Usina Santa Elisa provocou mudanças relevantes no panorama agrícola local, especialmente no tocante à produção e escoamento da cana-de-açúcar. Com a suspensão das operações industriais, a cana destinada originalmente à Santa Elisa passou a ser processada por outras unidades regionais mediante acordos firmados entre a Raízen e grupos sucroenergéticos parceiros.
Embora o Brasil disponha de capacidade instalada superior à demanda atual para moagem, esse redirecionamento exige adaptações logísticas e comerciais por parte dos produtores rurais. Pequenos fornecedores vinculados à Santa Elisa agora destinam sua produção a novas usinas receptoras, o que pode gerar desafios imediatos para adaptação operacional e manutenção da rentabilidade agrícola.
Especialistas apontam que o fechamento da unidade não deve provocar aumento nos preços do açúcar ou do etanol, pois outras plantas industriais absorverão a oferta remanescente. Contudo, a redistribuição pode alterar dinâmicas regionais de mercado e afetar a competitividade dos produtores locais.
Riscos de efeito cascata na indústria regional
A desativação da Santa Elisa acendeu alerta quanto ao potencial efeito cascata na indústria sucroenergética regional. O fechamento de uma usina com expressão operacional e histórica compromete contratos de manutenção, fornecimento e suporte técnico essenciais à cadeia produtiva local, abalando a saúde financeira de empresas parceiras e fornecedores.
O Ceise BR enfatiza que movimentos dessa magnitude ameaçam a sustentabilidade industrial do polo sucroenergético, podendo desencadear reações em cadeia capazes de prejudicar outras unidades industriais e setores correlatos. Há preocupação quanto à possível retração da atividade industrial, diminuição da capacidade inovadora regional e fragilização da competitividade que historicamente caracteriza Sertãozinho.
Ainda, o impacto social e econômico sobre trabalhadores e fornecedores pode retrair o consumo local, atingir setores do comércio e serviços urbanos e comprometer a economia municipal como um todo.
Medidas emergenciais e acordos trabalhistas
Com objetivo de mitigar prejuízos decorrentes do fechamento, foram firmados acordos entre o sindicato dos trabalhadores e a Raízen para assegurar direitos aos demitidos. Entre as medidas estão: pagamento integral das verbas rescisórias; abonos proporcionais ao tempo de serviço (um salário completo a cada cinco anos trabalhados); manutenção do plano de saúde, odontológico e seguro de vida por até seis meses; além do pagamento parcelado do vale-alimentação.
A prefeitura intensifica ações voltadas ao bem-estar dos afetados — promovendo mutirões de emprego e programas focados na requalificação profissional — com o intuito de facilitar a reinserção dos trabalhadores no mercado e apoiar suas famílias. Parcerias com empresas privadas e instituições técnicas também são estimuladas para expandir oportunidades.
Apesar dos esforços institucionais, o contexto permanece desafiador; o sucesso dessas medidas dependerá tanto da capacidade regional de geração de empregos quanto do engajamento efetivo das entidades envolvidas.
Caminhos para recuperação econômica de Sertãozinho
Diante das severas consequências econômicas e sociais provocadas pelo fechamento da Usina Santa Elisa, Sertãozinho encontra-se diante do desafio primordial de estruturar alternativas viáveis para reerguer sua economia local. A diversificação produtiva desponta como estratégia essencial para reduzir a dependência histórica do setor sucroenergético e ampliar as bases econômicas do município.
Apostar em inovação tecnológica e fortalecer setores complementares ao agronegócio podem impulsionar a revitalização econômica. Iniciativas que promovam o desenvolvimento de novas cadeias produtivas, estimulem o empreendedorismo local e invistam fortemente em capacitação profissional representam medidas eficazes para gerar empregos qualificados e dinamizar o ambiente econômico.
Além disso, atrair investimentos para segmentos variados — indústria de transformação, prestação de serviços avançados e tecnologia — contribuirá para ampliar as oportunidades disponíveis e tornar Sertãozinho menos vulnerável às oscilações específicas do setor sucroenergético.
Diversificação econômica: alternativas para o futuro
Para construir um futuro mais resiliente, Sertãozinho precisa explorar alternativas que promovam ampla diversificação econômica. Áreas promissoras incluem agroindústria de alimentos processados, energias renováveis, tecnologia da informação e comunicação; além disso, o turismo rural e cultural pode ser valorizado aproveitando-se o rico patrimônio histórico regional.
O fortalecimento da educação técnica e superior — aliado a políticas públicas voltadas à inovação e ao desenvolvimento sustentável — pode atrair novos empreendimentos e qualificar ainda mais a mão de obra local. Parcerias estratégicas entre setor público, iniciativa privada e instituições de ensino serão fundamentais para criar um ambiente propício ao crescimento diversificado.
Investimentos em infraestrutura logística e conectividade também são imprescindíveis para ampliar o alcance competitivo dos produtos sertanezinos nos mercados nacional e internacional. Assim, Sertãozinho estará melhor preparada para enfrentar desafios futuros com uma economia mais equilibrada, dinâmica e sustentável.
Referências
Raízen desativa usina histórica em Sertãozinho e acende alerta … — https://www.canaldacana.com.br/post-single.php?idnoticia=12611
Fechamento de usina da Raízen em SP resulta em 1,2 mil demissões, afirma prefeitura — https://timesbrasil.com.br/empresas-e-negocios/fechamento-de-usina-da-raizen-em-sp-resulta-em-12-mil-demissoes-afirma-prefeitura/
O fim das usinas de cana? Fechamento inesperado pela Raízen gera medo de demissões em massa e quebra em cadeia na indústria de cana-de-açúcar — https://clickpetroleoegas.com.br/o-fim-das-usinas-de-cana-fechamento-inesperado-pela-raizen-gera-medo-de-demissoes-em-massa-e-quebra-em-cadeia-na-industria-de-cana-de-acucar-afch/
Dois mil trabalhadores podem ser impactados pela suspensão das operações da Usina Santa Elisa — https://g1.globo.com/sp/ribeirao-preto-franca/noticia/2025/07/16/dois-mil-trabalhadores-podem-ser-impactados-pela-suspensao-das-operacoes-de-usina-em-sertaozinho-sp-diz-sindicato.ghtml
Fechamento da usina em Sertãozinho preocupa indústria e gera efeito cascata — https://www.conquistafm.com.br/noticias/raizen-justifica-decisao-como-reciclagem-de-portfolio-setor-teme-efeito-cascata