Panorama objetivo sobre os golpes que avançam na Alta Mogiana e orientações práticas para proteção e denúncia.
Mapa da nova geografia das fraudes
A Alta Mogiana vive uma mudança clara no perfil das fraudes: saem os golpes isolados, entram esquemas organizados, com atuação interestadual e infraestrutura digital própria. Investigações recentes mostram quadrilhas que exploram dados processuais públicos e credenciais vendidas para se passar por advogados, enquanto outra frente aproveita datas comerciais, como a Black Friday, para operar sites e lojas falsas que capturam pagamentos e dados pessoais. Na região que inclui Ribeirão Preto, Franca e Araraquara, prisões e apreensões revelam atuação coordenada entre operadores locais e redes maiores, com movimentações financeiras que variam de dezenas a centenas de milhares de reais por integrante.
As principais conclusões para gestores públicos, comerciantes e consumidores são claras: (a) os golpes combinam engenharia social, dados públicos e tecnologias de simulação (deepfakes de voz e clonagem de perfil); (b) a infraestrutura técnica — servidores, contas de pagamento e provedores — costuma se distribuir por diferentes estados e jurisdições; (c) a exposição de dados em processos eletrônicos e a reutilização de credenciais enfraquecem a confiança; e (d) já existem respostas institucionais (operações policiais e orientações do Procon), mas o cenário exige vigilância contínua e medidas locais de prevenção. Essas conclusões orientam as recomendações e o checklist de prevenção ao final deste relatório.
Como funcionam sites falsos e lojas da Black Friday
Em períodos de Black Friday e campanhas regionais, os golpistas repetem fórmulas testadas: criam páginas que imitam lojas conhecidas, anunciam “descontos milagrosos” e atraem consumidores por redes sociais, links em mensagens e anúncios pagos. A técnica básica envolve phishing (páginas que capturam login e dados), estoque falso (produtos que não existem) e boletos ou QRs adulterados que direcionam pagamentos para contas de terceiros. O Procon alerta para sinais típicos: erros de ortografia no site, domínios estranhos, ausência de HTTPS e CNPJ inválido, indicadores que reduzem a probabilidade de legitimidade.
Os golpes de Black Friday também exploram o comportamento do consumidor: pressa, busca por pechinchas e falta de checagem prévia. Golpistas usam atendimento falso via WhatsApp e perfis clonados em redes sociais para dar aparência de suporte ao cliente até a conclusão do pagamento. Além disso, há risco de instalação de malware por links e anexos, o que permite furtos de credenciais e de imagens pessoais. O caminho mais seguro segue o mesmo: pesquisar a reputação da loja, comparar preços antes da data promocional e, sempre que possível, usar meios de pagamento que ofereçam estorno ou proteção, como cartões com chargeback e plataformas reconhecidas.
Golpe do "falso advogado": modus operandi local
O golpe do “falso advogado” segue um roteiro conhecido. Criminosos identificam processos eletrônicos públicos ou invadem sistemas do Judiciário, obtêm dados de partes e advogados e, em seguida, entram em contato com a vítima por telefone, SMS ou WhatsApp. Alegam liberação de alvará ou necessidade de custas para “destravar” o pagamento. A mensagem costuma conter elementos que geram confiança, foto do advogado real, nome do processo e documentos falsos, e exige pagamento imediato via PIX ou boleto para contas controladas pelos golpistas.
Na prática regional já investigada, vítimas chegaram a transferir valores altos. Em uma denúncia que motivou apuração, o prejuízo individual alcançou cerca de R$ 50 mil, e suspeitos movimentaram até R$ 200 mil em poucos meses. Operações com mandados em Ribeirão Preto e outras cidades do interior paulista resultaram em prisões. A engenharia do golpe explora a urgência (“pague hoje”) e o desconhecimento sobre a forma correta de liberação de valores judiciais. Pagamentos de processos não se liberam por PIX ou boleto a pedido do advogado. A liberação ocorre por alvará expedido pelo juízo. A Polícia Civil recomenda sempre verificar diretamente com o advogado responsável, por canais que a vítima já possua e nunca pelos contatos enviados na mensagem suspeita.
Perfis das quadrilhas e conexões investigadas
As investigações apontam perfis variados. Há pequenos grupos locais especializados em contato com vítimas e engenharia social; operadores financeiros responsáveis por receber e distribuir valores em contas e empresas de fachada; e núcleos técnicos que fornecem acessos, logins e infraestrutura digital. Em nível nacional, surgem indícios de articulação entre esses grupos e organizações com maior capacidade técnica e logística, inclusive suspeita de venda de credenciais de advogados e possíveis conexões com organizações criminosas maiores, segundo autoridades que coordenaram operações interestaduais.
Na esfera local, a Polícia Civil de São Paulo cumpriu mandados e identificou indivíduos que atuavam como intermediários e “caixas” das quadrilhas, além de operadores que mantinham perfis falsos e páginas de atendimento. Relatos de presos que movimentaram somas relevantes em curto período indicam uma estrutura com divisão de tarefas: coleta de dados, falsificação de documentos, contato com vítimas e movimentação de recursos. A tendência é de maior sofisticação tecnológica, com clonagem de número de telefone e deepfake de voz, o que torna a identificação inicial muito difícil para quem não domina o tema.
Rotas operacionais: servidores, meios e jurisdições
As rotas operacionais apuradas são híbridas. Envolvem servidores web e contas de hospedagem em domínios de baixa regulação, muitas vezes situados em outros estados ou em provedores com política de controle mais frágil; contas bancárias e carteiras digitais abertas em nome de terceiros; e serviços de intermediação financeira que convertem rapidamente os valores em dinheiro, por meio de empresas de fachada. Investigadores utilizam quebras de sigilo bancário e rastreamento de pagamentos para mapear fluxos de dinheiro e identificar cooperadores financeiros.
A dispersão por diferentes jurisdições complica a repressão. Mandados e bloqueios exigem coordenação entre estados, e a distribuição de provedores e contas demanda cooperação entre Polícia Civil, bancos, plataformas de pagamento e tribunais. Soma-se a isso a prática de “lavagem” entre contas em diversos estados ou no exterior para dificultar a trilha do dinheiro. Por esse motivo, operações bem-sucedidas envolveram ações conjuntas e uso intensivo de inteligência, a fim de localizar servidores, identificar beneficiários finais e rastrear transferências. Para a população, o efeito direto é claro: um pagamento feito a um recebedor aparentemente local pode, na verdade, alimentar uma estrutura que opera em vários estados.
Impacto financeiro e social na Alta Mogiana
As perdas individuais costumam ser devastadoras. Aposentados e trabalhadores perdem economias de anos. Famílias veem reservas desaparecerem após cair em golpes. Em termos agregados, as investigações indicam movimentações que vão de dezenas a centenas de milhares de reais por integrante, o que, somado a diversas vítimas, revela impacto econômico relevante na região. Além do prejuízo direto, surge um efeito indireto: queda de confiança em compras online, desaceleração nas vendas de comércios locais que dependem do digital e cautela exagerada em promoções sazonais.
No plano social, a repetição desses golpes corrói a sensação de segurança e a confiança em instituições, advogados, lojas online, mensagens de bancos e órgãos oficiais. Vítimas relatam vergonha, resistência em usar serviços digitais e aumento do estresse financeiro. A necessidade de recorrer à Polícia Civil, Procon e instituições bancárias gera custo operacional e demanda por atendimento, o que pressiona serviços públicos e privados locais. Nesse cenário, medidas educativas e operacionais regionais, campanhas do Procon, orientação da OAB e ações policiais, tornam‑se essenciais para reduzir danos e reconstruir a confiança.
Checklist prático: prevenção, denúncia e apoio
A proteção começa pela verificação. Não clique em links recebidos por WhatsApp ou SMS sem confirmar diretamente com a fonte; confira contatos do advogado no Cadastro Nacional dos Advogados (CNA) ou em números já salvos; desconfie de qualquer pedido urgente de pagamento; e nunca transfira por PIX ou boleto sem checar CNPJ, nome do beneficiário e reputação do vendedor. Para compras na Black Friday, priorize lojas com histórico conhecido, use meios de pagamento com possibilidade de disputa (cartão) e guarde prints e comprovantes, pois esses registros podem ser decisivos em caso de litígio.
Se suspeitar que foi vítima:
- Registre boletim de ocorrência na Polícia Civil o mais rápido possível, anexando prints, números de telefone, comprovantes de pagamento e dados das contas envolvidas.
- Contate imediatamente o banco ou a instituição de pagamento para tentar bloqueio ou estorno e comunique formalmente a tentativa de fraude.
- Abra reclamação no Procon municipal ou estadual para obter atendimento em defesa do consumidor e orientação sobre direitos, estorno e medidas administrativas contra fornecedores envolvidos.
- Se o golpe usar dados judiciais ou suposta atuação de advogado, informe a OAB local e verifique o registro do profissional no CNA; advogados reais que tiverem dados clonados também devem registrar ocorrência.
- Preserve todas as evidências: não apague mensagens, mantenha registros de ligações (quando permitido por lei) e reúna qualquer material que comprove contato e transação.
Contatos úteis (procedimentos e canais):
- Polícia Civil: registre BO presencialmente ou pela delegacia eletrônica local. Informe números de telefone, dados de conta e, se possível, IPs. Nos casos já investigados na região, a Delegacia de Combate a Estelionatos e unidades locais coordenam quebras de sigilo e operações.
- Procon: registre reclamação e solicite orientação sobre tentativa de reversão de cobrança e abertura de processo administrativo contra a empresa ou lojista falso. Use os canais municipais ou estaduais indicados pelo Procon.
- OAB: em situações de uso indevido de nome, imagem ou dados de advogados, apresente denúncia para que a seccional atue na orientação da categoria e das vítimas.
Compartilhe essas orientações com vizinhos, familiares e comerciantes locais, fortaleça a rede de alerta na região e colabore com as investigações entregando todos os documentos que possam ajudar a rastrear os esquemas.